quarta-feira, 5 de junho de 2024

AUDIÊNCIA DISCUTE IMPACTOS AMBIENTAIS DA CONSTRUÇÃO DE ESPIGÕES NA PRAIA DO BURACÃO

Políticos e representantes da sociedade civil participaram, na manhã desta quarta-feira (5), da audiência pública Espigões na Praia do Buracão e os Impactos Ambientais em Salvador, na Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA). A proposição da audiência na Comissão de Infraestrutura, Desenvolvimento Urbano e Turismo, por parte do deputado Robinson Almeida (PT), partiu da provocação do movimento SOS Buracão, que reúne moradores, comerciantes, entidades ambientalistas na luta contra a construção dos edifícios, que trariam graves problemas ao meio ambiente e à população.O evento, que contou também com a presença das deputadas Neusa Cadore (PT), Olívia Santana (PC do B), Fabíola Mansur (PSB) e do deputado Hilton Coelho (Psol), dá sequência ao debate travado em audiência pública sobre o mesmo assunto em audiência pública em novembro do ano passado. Segundo representantes do movimento SOS Buracão, as obras causariam sombra na faixa de areia da praia, nos períodos da manhã e da tarde, formariam barreira contra a circulação dos ventos, aumentando a temperatura na região, trariam problemas biológicos e de saúde e causaria problemas de tráfego na rua, que é estreita e tem apenas uma saída, não comportando a circulação causada por um empreendimento com tantas unidades residenciais.
O deputado Robinson Almeida criticou a PEC 03, tramitando no Senado, que permite a privatização de praias, tendo como relator o senador Flávio Bolsonaro, e fez um paralelo com a situação local. “O absurdo é que aqui, em Salvador, há uma tentativa de privatização da praia. Essa tentativa de edificações na Praia do Buracão, na prática, é a privatização do espaço público, com um adensamento desproporcional daquele logradouro e, além disso, as repercussões de todo o ecossistema, principalmente com o sombreamento da faixa de areia na praia”.
Robinson disse ainda que o precedente deve ser evitado. “É passar a boiada. Depois, isso pode virar uma regra para toda a orla de Salvador, já com experiências comprovadas de insucesso e inadequação no Brasil, como é Camboriú, em Santa Catarina, que nós sabemos que não tem o resultado previsto de manter o destino turístico com o que há de mais importante para quem visita, que é a contemplação da natureza”, disse.
O parlamentar petista destacou que quatro partidos se uniram em prol da causa da Praia do Buracão, PT, PSB, Psol e PC do B, e ressaltou a pertinência de a audiência pública ser realizada no Dia Mundial do Meio Ambiente.
JUDICIALIZAÇÃO
Na sequência, o advogado que representa o SOS Buracão, Pedro Coelho, foi convidado a falar sobre a situação jurídica que envolve o projeto de construção das torres, trazendo informações a cerca das medidas judiciais que estão sendo tomadas. No momento, segundo o advogado, foi dada entrada numa Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), questionando o emaranhado legal entre o Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU), de 2016, e a Lei Orgânica do Uso e da Ocupação do Solo (Louos) de Salvador que permite uma flexibilização do potencial construtivo em imóveis de borda marítima que estejam degradados, dispensando estudos de impacto ambiental.
“Existe uma interpretação concatenada de diversos artigos que dialogam entre o PDDU e a Lous, algo extremamente difícil de se identificar numa primeira ou segunda leitura. Realmente, algo muito bem pensado e inserido, que escapou à sociedade civil. Esse emaranhado legal que dá uma carta branca para que possam sombrear as praias, ao nosso ver, é uma ilegalidade sob o ponto de vista da própria Lei Orgânica do Município e uma inconstitucionalidade no comparativo com as Constituições Federal e Estadual. É um absurdo que se possa ter uma permissividade tamanha, que se possa aumentar o potencial construtivo à beira mar sem que se faça os estudos solares pertinentes e, pior ainda, sem que se obedeça aquele mínimo que o PDDU estabelece de que não se pode sombrear das 9h às 15h”, disse Pedro Coelho. Ainda segundo ele, na ADI, existe um pedido cautelar para que fiquem suspensos os efeitos do artigo até que se julgue o mérito da causa.
O deputado Hilton Coelho (Psol) inciou seu discurso sugerindo que a ALBA deveria oficiar a PM sobre um episódio relatado, na audiência, de violência sofrida por manifestantes do Movimento SOS Praia do Buracão na Câmara de Vereadores de Salvador. Na sequência, o deputado criticou o capital financeiro que avança com a especulação imobiliária.
“As forças de ultradireita não têm conexão com os interesses coletivos da maioria. Esse pessoal está a serviço do interesse do capital, para acumular sem qualquer escrúpulo. Eles estão chamando a PEC 03 de a Cancún brasileira. É um nível de cinismo desse pessoal que a sociedade precisa entender. Essa extrema direita está perdendo a vergonha de negar tudo ao nosso povo”, afirmou o legislador.
Hilton disse que é preciso compreender tal contexto para entender a dimensão do sombreamento na praia no bairro do Rio Vermelho. “Não estamos falando apenas do Buracão, mas de perder tudo, porque tudo tem que entrar na lógica de mercado, porque eles não sabem como é que vão ficar mais bilionários. Em plena pandemia, quando a pobreza se alastrou no mundo e neste país de forma grotesca, aumentou em quase 50% o número de bilionários no Brasil. É isso que está por trás disso aí. E é isso que o prefeito Bruno Reis representa”, declarou.
A deputada Neusa Cadore (PT) saudou o movimento da Praia do Buracão. “Esse movimento é essencial. Apesar de toda a dificuldade, porque eles, do poder econômico, não têm limite, que também não tenha limite a nossa resistência, a nossa retórica. Vamos colocar a nossa Casa, a nossa Frente Parlamentar e saudar esse exemplo. Estamos avançando, mesmo que pareça que estamos amordaçados. Que estejamos firmes, para nunca nos rendermos”.
Olívia Santana (PC do B) falou que são poucos os deputados engajados na pauta da Praia do Buracão e do uso do solo em Salvador. “Às vezes, há um desprestigio generalizado com relação à política, mas essas são decisões do campo político... É urgente que a gente amplie mais essa luta, esse movimento. Aproveitando que, hoje, está na ordem do dia a PEC 03, uma PEC nefasta”, disse a parlamentar.
Ela acrescentou que “é preciso um debate mais vigoroso sobre Salvador, sobre como os candidatos vão tratar a orla de Salvador, como os candidatos vão tratar esse problema da crise climática”. Segundo ela, “não há nenhuma política ambiental comprometida realmente com o novo padrão de crise climática”.
A deputada Fabíola Mansur (PSB) destacou a importância do Poder Legislativo pautar o Judiciário nas lutas sociais e lembrou que é importante ter a sociedade civil organizada. “Existe a democracia representativa, mas há também a participativa, como o SOS Buracão, o Movimento Stela Mares... Essa mobilização aqui é extremamente importante, porque ela está pautando quem está ouvindo a TV ALBA, os deputados, essa Casa e certamente vai pautar o Judiciário”.
A parlamentar socialista também se colocou à disposição da causa. “Nem toda revolução é pegar em armas, mas quero aqui dizer que tratores não passarão, e eu estarei lá com vocês deitada no chão. E quero afirmar isso aqui”, afirmou, dizendo ainda que solicitou audiência com a presidente do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA), desembargadora Cynthia Maria Pina Resende, para tratar do assunto da Praia do Buracão.
Por fim, o deputado Robinson Almeida anunciou os encaminhamentos extraídos da audiência. Um ofício será enviado à Câmara de Salvador sobre a agressão de manifestantes do Movimento SOS Buracão; ficará a cargo do movimento a realização de uma carta-programa sobre o tema específico da praia e, mais amplamente, sobre a questão ambiental, a ser apresentada a candidatos a prefeito e vereador da cidade; a deputada Fabíola Mansur marcará uma audiência com a presidente do Tribunal de Justiça para tratar da ADI; e ficou registrada a sugestão de instalação de uma CPI para tratar de licenciamento ambiental.
Além dos citados, participaram da mesa Isabel Peres, do Coletivo de Stela Mares; Daniel Passos, do Movimento SOS Buracão; Renato Cunha, membro do Conselho Estadual do Meio Ambiente, e Miguel Sehbe, presidente da Associação de Moradores do Barro Vermelho.

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