Bolsonaro cairá. Não pelas ostensivas ligações de sua família com as milícias no Rio de Janeiro, mas cairá. Aos donos do poder pouco importa terem um miliciano como presidente, desde que faça as reformas que requerem. Mas Bolsonaro é o cara errado, é incapaz, um ser completamente imbecilizado, e já escrevi sobre isso. Ele foi e será o idiota útil até quando interessar ao sistema. O ministro Marco Aurélio rejeitou o foro privilegiado de Flávio Bolsonaro, e é óbvio que as conexões com as milícias brotarão ainda mais. Já há evidências de crime de peculato e outras surgirão.
A semiótica é uma ciência fascinante, e basta percepção e análise simples, rasas, para se enxergar a construção da figura do presidente “ideal”: Hamilton Mourão. Desde Davos, as imagens que publicam de Bolsonaro o “desqualificam”: um homem com semblante assustado, medroso, um homem desalinhado, a ausência revelada na foto da entrevista que não aconteceu, um homem submisso e subserviente, a pessoa errada no lugar errado. Além disso, usam as falas equivocadas, os erros de português, as mentiras, que o transformam numa figura idiotizada. E ele o é. Basta uma réstia de senso crítico para enxergar isso.
Em contrapartida, constrói-se uma imagem inversa de Mourão, o vice que aparece mais que o presidente. Desde a posse, Mourão aparece alinhado, em ternos de bom corte. Seu discurso em nada lembra o general autoritário e tresloucado da campanha eleitoral, que chamou indígenas de indolentes e negros de malandros, que preconizou o fim do 13˚ salário, que falou sobre refazer a Constituição Federal com um colegiado de especialistas. Agora, por algumas vezes, desautorizou ou contradisse o presidente, demonstrando bom senso. Rejeitou a intervenção brasileira na Venezuela, negou a mudança da embaixada brasileira em Israel para Jerusalém, colocou-se contra a privatização dos Correios, colocou-se favorável à descriminalização do aborto, entre outras posturas que, em princípio, poderiam soar como posições progressistas. Constroem a imagem de um presidente muito mais capaz e digno ao cargo.
Mourão é o nome ideal da Rede Globo e de outras empresas e instituições que exercem o poder de fato no país. A idiotia de Bolsonaro não os serve. A ligação estreita com a bancada evangélica, e suas alucinações de poder, não interessam aos poderosos, e nem a nós, claro. Portanto, Bolsonaro cairá.
No entanto, Mourão não é o gentleman que tem fingido bem ser. Ao contrário, é autoritário e sectário, como o tresloucado da campanha, mas é infinitamente mais inteligente que Bolsonaro, e encera muito bem e pacientemente o chão para puxar o tapete do presidente. E assim o fará.
Os fãs-eleitores de Bolsonaro, que em sua maioria são os mesmos que eram fãs-eleitores de Aécio, estão assustados, perdidos, ainda não sabem como se posicionar. As posturas do vice são uma surpresa negativa. Já há os insanos que o chamam de comunista. São os que ainda defendem o presidente e suas posturas fascistas. Ao cair Bolsotão.naro, a quem chamaram de Mito, dirão que nunca tiveram político de estimação, e passarão a adorar Mourão. Talvez um ou outro alucinado ande sem rumo pelas ruas gritando "a nossa bandeira jamais será vermelha”…
A nós, progressistas, não há motivos para comemoração. Quer dizer, a queda de Bolsonaro e sua matilha, será motivo de comemoração sempre. O clã miliciano precisa ser punido. Além do que a onda de idiotia que assola o país talvez se amenize um pouquinho. No entanto, em termos políticos, pouca coisa mudará. E haverá um presidente militar, autoritário e retrógrado, sustentado no poder pelos meios de comunicação hegemônicos. Infelizmente, a construção das narrativas continua a ser deles, ou dos que patrocinam posts no WhatsApp. De toda forma, está sob a égide do Capital. Enquanto isso o país continuará mergulhado na indigência intelectual profunda e no messianismo político. Mourão será o Mitão.
Aliás, os que dizem não terem político de estimação, sempre os tiveram, de Maluf a Bolsonaro, pois a maior parte dos que votaram em um votavam no outro.
* Atentem-se na semiótica. Lembrem-se da desconstrução da imagem da Dilma por parte da mídia. Muita coisa se repete.
Texto de Cadu de Castro
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